COMO A TI PODE TRANSFORMAR OS CUIDADOS DE SAÚDE
MEADOS DA DÉCADA DE 1990, era fato notório que nas empresas de cuidados de saúde em todos os Estados Unidos o desperdício de dinheiro era uma verdadeira praga. Na época, a Intermountain Healthcare, que atende residentes dos estados de Utah e Idaho, perguntava-se por onde deveria começar a busca por economia interna. As análises de dados logo identificaram os alvos mais promissores: 95% dos cuidados presta-dos consistia no tratamento de 104 — em um total de 1.440 —, e 21% do trabalho resultava de dois serviços: parto e tratamento de doença isquemica do coração.
As equipes de qualidade focaram esses dois serviços. Armados com um sofisticado sistema de registro de saúde eletrônico (RSE) e um sistema de tecnologia de informação que detalhava os custos das atividades, as equipes se baseavam em diretrizes fundamentadas em evidências e na experiência dos médicos da Intermountain para reorganizar o trabalho clínico. Altos executivos, membros do conselho, médicos e enfermeiros trabalharam juntos. Hoje, mais de 60 serviços foram renovados e a Intermountain é reconhecida como líder nacional em melhoria de qualidade e gestão de custos. Nada disso seria possível sem os sistemas de TI.
Trata-se de um exemplo impressionante, mas, infelizmente, ainda muito raro. O mais comum em cuidados de saúde é a empresa fazer grandes investimentos em TI, mas com pouco resultado. Estimulados por exemplos como a Intermountain, os Centers for Medicare and Medicaid Services do governo dos EUA gastaram, de 2011 a maio de 2017, US$ 37 bilhões apenas em pagamentos de incentivos para TI de saúde. Em 2016, mais de 50% dos médicos de consultório e mais de 80% dos hospitais instalaram um sistema de RSE “básico”, que atende aos padrões mínimos estabelecidos pela Agência de Coordenação Nacional de Tecnologia da Informação em Saúde. No entanto, até o momento, esses sistemas tiveram pouco impacto na melhoria da qualidade e redução de custos. Na verdade, os profissionais clínicos os criticam com insistência, alegando que eles desperdiçam tempo, são rígidos e difíceis de usar e interferem na interação com os pacientes. Muitas organizações de cuidados de saúde têm mais prejuízo que lucro, pois sofrem para integrar novos sistemas de TI em suas operações. Em janeiro de 2017, por exemplo, o MD Anderson Cancer Center anunciou a demissão de 900 funcionários, ou cerca de 5% de sua força de trabalho, em grande parte devido a perdas financeiras provocadas pelo novo sistema de RSE. De forma mais ampla, os esforços para convencer organizações de cuidado de saúde a compartilhar informações ainda são incipientes, assim como as iniciativas para permitir que diferentes sistemas de TI se comuniquem entre si, fazendo com que os dados permaneçam “presos” em bancos de dados isolados. A aparente desvantagem dos sistemas de TI pode ser explicada, em grande parte, pela forma como são usados. Por enquanto, a prioridade da maioria das organizações de cuidados de saúde é substituir documentos em papel por eletrônicos, e otimizar o faturamento para maximizar os reembolsos. Embora isso tenha aumentado as receitas, o impacto da TI na redução dos custos e na melhoria da qualidade dos cuida-dos clínicos tem sido modesto e limitado a atividades facilitadoras — como o prontuário eletrônico, que permite ao paciente obter exames e medicamentos com rapidez e precisão. Poucas organizações foram além disso, analisando a riqueza de dados em seus sistemas de TI para entender a eficácia do cuidado que ofere-cem. Dito de outra maneira, muitas organizações de cuidados de saúde usam a TI como uma ferramenta para monitorar os processos e protocolos atuais. Apenas um pequeno número, porém, aproveita esses mesmos sistemas de TI para verificar se esses processos e protocolos podem ser melhorados e, em caso afirmativo, tomar as medidas cabíveis. Essa é uma das principais razões de o crescimento da produtividade na área de cuidados de saúde ter sido anêmico e mais fraco do que em muitos outros setores (ver a exposição “Desventuras da produtividade nos cuidados de saúde”). Embora muita atenção esteja sendo dada aos potenciais benefícios médicos das novas tecnologias — como o rastreio genético barato, a inteligência artificial e os sensores portáteis que monitoram continuamente os sinais vitais —, nosso objetivo aqui é mostrar que as organizações que prestam cuidados de saúde podem obter muito mais de seus investimentos recentes ou planejados nos sistemas de TI. Baseados em pesquisas em outros setores, sugerimos que, em vez de entender a TI como uma ferra-menta transacional para cobrança, monitoramento e verificação de erros, as organizações devem abraçá-la como um instrumento capaz de ajudá-las a transformar o modo como elas entregam os cuidados médicos. Isso implica priorizar a melhoria da qualidade sobre os cortes de custos, tornar a coleta de dados melhor e mais fácil, transformar dados em informações relevantes para os profissionais clínicos e forjar novos modelos operacionais e de negócio. Descobrimos que, embora numerosas organizações de saúde este-jam caminhando nessa direção, a maioria não está fazendo as mudanças holisticas necessárias para essa transformação.
MELHORE A QUALIDADE
Historicamente, a adoção e gestão de TI de cuidados de saúde é responsabilidade do diretor de informações e de outros técnicos da organização. Isto é um erro. Uma série de organizações — como Boston Medical Center, Geisinger Health System, na Pensilvânia, Intermountain, Mayo Clinic e New York Univer-sity (NYU) Langone Health — demonstraram que a TI em cuidados de saúde é eficaz apenas quando todos os membros da organização trabalham juntos para realizar seu potencial. (Para insinformativos: um de nós, Robert Huckman, lecionou em programas de educação executiva em duas organizações relacionadas com este artigo — a Intermountain Healthcare e a Brigham and Women’s Hospital, de propriedade da mesma em-presa-mãe do Massachusetts General Hospital.)
Dois grupos-chave de clientes que não fazem parte do pessoal técnico — líderes seniores e proissionais clínicos — devem desempenhar papéis signiicativos. Líderes são cruciais porque terão de recrutar prois-sionais clínicos para a causa e persuadi-los de que o uso efetivo da TI é fundamental para oferecer melhor qualidade. Devido à urgência de reduzir os custos dos cuidados de saúde, muitos líderes se preocupam com esse objetivo. A boa notícia é que é possível melhorar os processos de trabalho clínico reduzindo os custos e aumentando a qualidade — mais adiante, discutire-mos como os sistemas de TI podem fazer isso.
O compromisso de melhorar a qualidade não pode icar na promessa — deve ser implementado na prática.
TRANSFORME DADOS EM INFORMAÇÕES ACIONÁVEIS
Convencer os proissionais clínicos a se envolver com um novo sistema de TI — e torná-lo menos oneroso para eles — é apenas meio caminho andado. Transfor-mar os dados coletados em “informações acionáveis” (capazes de embasar decisões) é também vital e requer o apoio da liderança sênior. Uma das tarefas mais crí-ticas para o líder é estabelecer expectativas de como o sistema será estruturado. Não nos referimos às especi-icações técnicas, mas às diretrizes organizacionais ou culturais sobre como usar os dados para apoiar ativi-dades diárias relacionadas aos cuidados.
Um passo fundamental é estabelecer um banco de dados central e garantir que os profissionais clínicos entendam sua importância.
Fonte: Harvard Business Review